quarta-feira, 23 de maio de 2007

Pra quem tem medo do Rio
(cronica de Elano Ribeiro Baptista, publicada na revista "Cronicas Cariocas" - www.cronicascariocas.com.br)


Começo a escrever essa crônica poucas horas depois de chegar do Rio de Janeiro. Acho que já disse aqui nesse espaço – se não disse, digo agora – que resido no interior do estado, à cerca de noventa quilômetros da capital. Distância curta, facilmente superada numa viagem de, no máximo, duas horas. Mas, mesmo estando tão próximo, não costumo ir muito à cidade maravilhosa, ainda assim, sou fascinado por aquele lugar que, apesar de tudo, continua encantador.

Nesse fim de semana saí da rotina – quase sempre muito tranqüila – de uma cidade do interior e fui pro Rio de Janeiro. Enquanto passava pela Linha Vermelha indo pra Ilha do Governador, onde me hospedei na casa de meu cunhado, vieram-me à cabeça diversas lembranças de reportagens sobre tiroteios entre traficantes e policiais naquela rodovia. Veículos tentando voltar na contramão, pessoas abandonando seus carros e atirando-se ao chão para se proteger das balas perdidas – perdidas? – atrás da mureta de separação das pistas. Uma sensação angustiante pra quem passa os 365 dias do ano sem presenciar um assalto ou ouvir um tiro.

Felizmente, cheguei muito bem ao meu destino. A essa altura, já estava dentro de uma vila militar, protegido – protegido? – por muros, guaritas e soldados. Mas não estava satisfeito. Que tranqüilidade mais estranha é essa? Eu, passando o fim de semana numa cidade linda, porém, cercado por muros. Não. Queria sair e ver gente. E, foi numa dessas saídas, que tive uma bela surpresa.

Fomos num bar, ali mesmo na Ilha. Um lugar agradável, com boa música, gente bonita e cerveja gelada. Enquanto bebericava e conversava, comecei a perceber algo que, para alguém como eu, que sempre ouve, assisti e lê notícias assustadoras do Rio de Janeiro, parecia surpreendente. Em plena madrugada, pessoas circulavam despreocupadas pelas calçadas. Casais de namorados passeavam de mãos dadas, abençoados pela linda noite de lua brilhante no céu. Quando estávamos indo embora fiquei ainda mais surpreso com o que vi. Uma praça – com a igreja de Nossa Senhora dos Navegantes – lotada de jovens aproveitando a madrugada tranquilamente, como se estivessem numa pequena cidade do interior. Sem medo de serem assaltados ou coisa pior. Pelo menos, era essa a sensação que eles transmitiam.

Quem mora no Rio de Janeiro, pode estar se perguntando o porquê de eu estar escrevendo sobre isso, afinal, o que eu vi naquela praça pode ser a coisa mais normal do mundo. E tomara que seja mesmo. Mas, geralmente, a impressão que se tem pelas notícias que circulam diariamente nos jornais, é de que nenhum ser no seu perfeito juízo anda pelas ruas da cidade ou para pra conversar sobre a vida, em plena madrugada, num lugar aberto, sem a proteção de seguranças, grades ou muros. Principalmente, quando não se tratam de regiões teoricamente mais seguras, como a Zona Sul e a Barra da Tijuca.

Não conheço a geografia da cidade maravilhosa, mas, posso supor que existam diversos lugares onde não seja possível se divertir em praça pública. Mesmo assim, quando me deparei com todas aquelas pessoas se divertindo, tive uma explosão de alegria. Achei que aquilo era uma resposta às pessoas – bandidos e políticos – que insistem em destruir um lugar que é “abençoado por Deus e lindo por natureza”. Pude até imaginar o que elas diziam:

- Nós estamos aqui, felizes e de bem com a vida. O Rio de Janeiro não é só bala perdida, guerra de traficantes, arrastões, assaltos. É, acima de tudo, a morada de um povo cordial, alegre, educado e hospitaleiro, que consegue transformar as adversidades em sorrisos cativantes e supera todas as dificuldades na certeza de dias melhores. Esse lugar é mágico e, por isso, estamos brindando, tendo essa linda lua e Nossa Senhora dos Navegantes como testemunhas.

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