quarta-feira, 6 de junho de 2007

Você sente saudades?
(crônica de Elano Ribeiro Baptista, publicada na revista "Cronicas Cariocas" - www.cronicascariocas.com.br)


Eu sinto. Tenho saudades da minha infância toda vez que vou à casa de minha mãe e olho aquele imenso quintal que, outrora, foi repleto de árvores frutíferas, onde eu brincava com meus amigos de polícia-e-ladrão e pique - esconde. Entre tantas árvores, havia uma ameixeira enorme, de galhos longos e fortes, o que me possibilitava chegar até a ponta deles e balançar ao sabor do vento. Essa árvore era na minha fértil imaginação de criança, um veleiro que singrava os mares, um helicóptero que me colocava dentro das nuvens, ou ainda, uma caverna que me abrigava nos momentos de tristeza, em que a única coisa que eu queria, era ficar sozinho. Sim, meus amigos leitores, às vezes, até as crianças sentem vontade de ficar sozinhas.

Tenho saudades da casa dos coelhos, que eu visitava com meu pai todos os dias e, pacientemente, alimentava um a um com uma pequena cenoura. Tenho saudades de meu pai. Do dia em que ele me levou numa loja para comprar minha primeira bicicleta, das manhãs de domingo em que íamos lanchar numa doceria e voltávamos pra casa de mãos dadas e de todos os sábados em que eu o levei para passear na sua cadeira de rodas – foi justamente nessa época que nos tornamos mais amigos e menos pai e filho, mas isso eu conto numa próxima crônica. Tenho saudades do colo de minha mãe, colo mesmo, aquele que só temos quando somos bem crianças.

Recentemente, assistindo a um programa de TV, vi uma atriz – que agora não me recordo o nome – perguntar ao multifuncional Marcos Caruso (ator, diretor, roteirista) se ele sentia saudades de algum personagem que havia interpretado? Ele respondeu que não sente saudades de nada. Na hora, fiquei na dúvida se ele se referia apenas aos seus personagens, ou se também estava colocando naquela resposta tudo o que ficou pra trás na sua “vida real”. Achei melhor fechar com a primeira hipótese, pois, creio eu, ser improvável que alguém consiga viver sem sentir saudades.

Como não sentir saudades da primeira namorada; do primeiro beijo; do primeiro “eu te amo” que alguém nos falou? Ah, impossível. Os anti-saudosistas que me perdoem, mas – parodiando Vinícius de Morais -, saudade é fundamental. Esse sentimento nos transporta para momentos de grande alegria, ou, nos coloca novamente “ao lado” de pessoas que, de alguma forma, nos fizeram felizes e, por um desses caprichos do destino, nunca mais vimos ou sequer ouvimos falar. E, já que citei Vinícius, quantos poetas e compositores já não pegaram carona na saudade?

O próprio “Poetinha”, junto com Tom Jobim apelou para que a tristeza pedisse em prece a volta da amada, em “Chega de saudade”. Numa parceria com Hermano Silva, o grande mestre Vinícius perguntou de forma poética: “-E por falar em saudade, onde anda você, onde andam seus olhos que a gente não vê?...”. Mesmo não sendo apreciador do estilo sertanejo, não posso deixar de citar a imensa quantidade de músicas cantadas com esse tema, por diversas duplas. Essa turma é campeã em pedir, cheios de nostalgia, a volta da mulher amada. Uma delas chegou inclusive a afirmar que, “a saudade é um prego e o coração é um martelo”.

Certa vez, recebi uma carta de alguém que na época era uma ex-namorada e hoje é minha esposa. Estávamos separados por milhares de quilômetros e cheios de saudades um do outro. Depois de anos de namoro optamos por viver coisas novas, porém, cada qual ao seu modo e, pra isso acontecer, não podíamos mais ficar juntos. Quando percebemos que nós nos completávamos, recebi a tal carta que citei acima e, num determinado trecho, Laura pegou emprestado um pouco da saudade de Vital Farias, e escreveu o seguinte: “Não se admire se um dia, um beija-flor invadir a porta da sua casa, te der um beijo e partir, fui eu que mandei o beijo, que é pra matar meu desejo, faz tempo que não te vejo, ai que saudade de ocê...”

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