sexta-feira, 9 de março de 2007

Sobre Carinho e Afeto
(crônica escrita por Elano Ribeiro Baptista, publicada na revista eletrônica "Crônicas Cariocas")www.cronicascariocas.com.br




Trabalho há treze anos numa escola pública de horário integral e já há algum tempo venho observando a rotina dos pais de nossos alunos, que nos entregam seus filhos às oito da manhã e voltam para buscá-los às quatro da tarde, quando já estão ansiosos para retornar aos seus lares. Senhores e senhoras aflitos de saudades, correm de braços abertos na direção de seus filhos.

Deveria ser assim, mas não é, pelo menos pra maioria, que demonstra total indiferença no momento do reencontro diário com suas crianças. Nem um sorriso, nem um beijo. No lugar desses carinhos, rostos fechados, deixando transparecer claramente que se as aulas fossem até as dezessete, dezoito ou vinte horas, seria um tanto melhor. E, não raro, alguns “esquecem” de pegar seus filhos na hora correta. A distância parece cômoda. Já ouvi o seguinte comentário por parte de uma senhora, em relação à proximidade do fim do ano letivo:

- Vão começar as férias, esse é o pior período do ano pra mim. Criança em casa o dia todo é horrível.

Existem também aqueles pais que falam o que vem à cabeça sem se importar com o fato do filho estar ao lado, ouvindo tudo claramente. Certa vez solicitei que a mãe de um de nossos alunos me trouxesse os documentos pessoais dela e do pai da criança. Obtive a seguinte resposta, dita exatamente desta maneira:

- Ah, eu não sei nem por onde anda aquele infeliz. Ele só quis saber de fazer e caiu fora.

Fico me perguntando, o porquê dessas atitudes? Será que esses pais não tiveram nenhum tipo de carinho e amor quando crianças, e por isso não conseguem transmitir afetividade alguma? Conheço uma pessoa assim, um grande amigo, que cresceu sem saber o que era um abraço, um beijo, um momento destinado para as brincadeiras e para o diálogo, tanto por parte de sua mãe quanto de seu pai. Há seis anos a vida lhe presenteou com uma linda menina, porém, por mais que a ame, não consegue expressar esse sentimento para a filha, tanto em palavras quanto em gestos. Para ele, dizer eu te amo é algo extremamente complicado.

Há de se ressaltar que, quase a totalidade das famílias a que me refiro são muito carentes, enfrentam sérios problemas financeiros e sociais, porém, em minha opinião, nada disso justifica a falta de carinho e afeto, dois fatores fundamentais no desenvolvimento de uma criança, e que certamente, servirão como pilares na sua formação. Costumo dizer que, quase sempre, os filhos são reflexos de seus pais. Como irão crescer essas crianças, que hoje não têm a mínima atenção por parte de quem elas esperam o máximo?

No excelente livro Perdas & Ganhos, Lya Luft escreveu o seguinte: “Crianças, seja em que família for, serão seguramente – não principalmente – um problema e uma tarefa. Para que nos signifiquem alegria nós as teremos de querer e amar...”.

Um comentário:

maria claudete disse...

Elano, fui educadora , acredito, em todas as etapas que o processo educacional permitiu. Fui professorinha desde a alfabetização até o ensino Superior , e confesso , não tive os contatos que vc teve com pessoas ditas marginalizadas da sociedade, sempre ensinei em Escolas onde os alunos tinham poder aquisitivo de médio para cima , minha realidade se transformou quando deixei, por opção, de lecionar em Faculdades Particulares para enfrentar o ensino na Universdidade Federal,e vi que a mistura de classes sociais ao invés de socializar as pessoas fazia um processo de exclusão , com raras exceções. AS OPORTUNIDADES eram semprer para os mais privilegiados. Mas voltando ao seu tema, amei e fico feliz de, mesmo já aposentada, ver que o ideário do verdadeiro Professor continua em educadores como vc. Parabéns.